"O Livro", aquele que para mim é único - Odisseia de Homero
22/04/2016 by Paula
A nossa convidada de hoje é a escritora Romana Petri.
Romana Petri nasceu em Roma, onde vive. Tradutora, crítica
literária, escreve regularmente para várias revistas e jornais italianos entre
os quais, L’Unitá e Il Messagero di Roma. É actualmente também editora, responsável pela divulgação
da literatura portuguesa em Itália.
Considerada uma das vozes mais representativas da
actual escrita italiana, inicia a sua carreira literária em 1990 com Il gambero blu e
altri racconti (Prémio
Rapallo e Prémio Mondello opera prima). Entre as suas obras mais aclamadas
destacam-se Uma Guerra na Umbria - Case Venir, Prémio Rapallo-Carige, finalista Prémio Strega 1998, A Senhora dos Açores, Prémio Grinzane Cavour 2002; e Os Pais dos Outros, Prémio Chiara e Prémio CittàdiBari. Os seus livros estão
traduzidos em português, inglês, francês, alemão e neerdlandês.*
"O livro que mudou a minha vida foi a Odisseia de Homero.
Contudo, o meu primeiro contacto com a sua história não foi através da sua
leitura, mas sim escutando-a. Eu tinha somente quatro anos e quem me a contou foi o
meu pai nas primeiras horas de uma manha de Verão, ao mesmo tempo em que nadava
comigo
nas suas costas. Nadou durante 3 horas sempre comigo junto dele, e eu
fiquei deslumbrada pela beleza do tema que entretanto me narrava: a vingança.
Era a história de um homem que não conseguia regressar à sua terra e que
durante muitos anos teve de permanecer longe da mulher e do seu filho ainda que
contasse com a ajuda da deusa Atena. As coisas que lhe aconteceram eram aos
meus olhos surpreendentes, extraordinárias. Eu escutava o relato plena de
entusiasmo e com a impressão de ser eu própria aquele filho que quase não se
lembrava do seu pai e que tinha ido à procura dele para que a sua mãe não
voltasse novamente a casar.
O meu pai foi um actor e cantor lírico, o seu nome era
Mario Petri. Possuía uma grande habilidade para contar historias. Era tão bom a
contá-las que eu chegava ao ponto de me confundir com as suas personagens. E
durante aquela tarde na água, à medida que nos afastávamos da terra firme em direcção
a um horizonte líquido, foi isso mesmo que me aconteceu: tornei-me Telemaco,
que ajudava o seu pai na luta contra os pretendentes da sua mãe. No final,
convenci-me de que fomos nós dois juntos, que os matamos. Só muitos anos depois
li finalmente o livro. E na primeira leitura que fiz dele (depois fiz muitas mais,
e ainda hoje continuo a relê-lo) tive a sensação, não de ler, mas de ver a
historia, de a visualizar em imagens nítidas. E foi assim que aprendi que a
literatura não é uma coisa que permanece no exterior da nossa vida, mais sim
uma coisa verdadeiramente nossa, que nos mudamos e moldamos ao ponto de não
haver dois leitores a lerem o mesma historia, porque cada um consegue
entreter-se e reescreve-la a cada leitura."
Romana Petri
* informação retirada da wook