“Islâmicos 14:38” de Isaac Jaló (Divulgação)
23/05/2018 by Lígia
Sinopse:
“O
trio tomou-a pelas mãos, tentando domar o seu corpo barafustador que se recusava
a render-se. Pegou-lhe, uma das três, a sua perna esquerda, à medida que outra
pegou a sua perna direita. A terceira, de alas abertas, aproximou-se dela com a
lâmina, A mãe mirava o chão, penosa, a criança mirava o texto, desesperada. A gritaria
imensa pelo socorro passava nula pelas pessoas, como se a ação se passasse numa
película de um filme mudo. Antes fosse uma mera película aquele pedaço de pesadelo.
"Larguem-me, larguem-me. Por favor, larguem-me", mas não. Segurada, firmemente,
impotente, prosseguiu o seu corpo para a feita do gume, a vagina como
seu
alvo. Imagine-se a dor, o horror. Seguiram-se cortes no seu interior, cortes
nada cirúrgicos, cortes caseiros, cortes que não vinham em manuais nem se
aprendiam em aulas de medicina. Cortes aleatórios com fim determinado, o
clitóris feito vítima com os seus lábios descascados por quem seguia a ciência da
cultura. E então a coloração múltipla do vestido resumiu-se numa só, um
vermelho carregado de trauma e angústia. O choro cessara-se por suspensão da
consciência. Um desmaio interrompeu os sentidos de Fatumata, mas não interrompeu
a operação. Corpo inanimado, rezava-se para que ainda estivesse vivo, o que
poderia não acontecer. Eram muitas as que morriam mutiladas. Morta ou não,
deu-se continuidade, uma lâmina tão pequena dera forma à maior das atrocidades.
Uma criança tão pequena dera lugar à maior das atrocidades. E por uma perspetiva
tão paupérrima como a de selar a sua virgindade. Depois de indevidamente
cortada, ervas e pastas deram entrada, não só em cena, mas no interior dos seus
genitais mutilados. Introduzidos com o propósito de facilitar a cicatrização. E
para conclusão do processo que deixava marcas para uma vida, não só físicas,
como emocionais e psicológicas, as pernas eram fortemente atadas, fechadas para
que aquela zona cicatrizasse, simplesmente por encerramento. Agora sim,
largavam-na, agora podiam porque a missão estava cumprida. Estava ela purificada.
E estavam elas gratas. Porque, de igual modo, tinham-se também purificado as
suas mães e as suas avós. Fatumata daria continuidade ao legado que
apelidavam
de fanado, outro dos rituais que empobrecia tão rico continente.”
Num mundo onde os
valores morais são postos à prova diariamente, vive Fatumata, adolescente
nascida e criada no seio de uma família de muçulmanos, cujas tradições lhe
estão marcadas a ferro e fogo no corpo e que vê a sua inocência ser-lhe
arrancada da alma, impotente. É na sua crença que vai encontrar a força para
escolher um novo caminho para percorrer. Esta é a história do amor, da fé, da
vontade e da perseverança, contada pela voz de alguém que acredita.
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