"Cinco Esquinas", Mario Vargas Llosa (Opinião)
19/11/2016 by Vasco
Sinopse
À conversa, sem os maridos, e desatentas da hora do recolher obrigatório, Chabela e Marisa terão de pernoitar juntas. O que aconteceu na cama nessa noite passará a ser um grande e saboroso segredo. Chabela é mulher de um advogado de renome; Marisa, de uma das figuras cimeiras da exploração mineira. O mundo perfeito em que vivem - não fora a constante ameaça dos guerrilheiros e sequestros - será fortemente abalado por um escândalo. Após tentativa de chantagem por parte de Rolando Garro, diretor do pasquim Destapes, a participação do engenheiro Enrique Cárdenas numa orgia será tornada pública em todos os seus pormenores mais sórdidos. Segue-se um assassínio brutal. Mas a relação de tudo isto com o poder político, nomeadamente com o homem que na verdade governa de forma corrupta e autoritária o país, o Doutor, braço direito do presidente, será trazida à luz: curiosamente pela coragem e fibra da redatora principal do referido tabloide que usa o nom de plume «La Retaquita».
Opinião
Inquietante. Multidimensional. Incendiário.
Contrariamente ao que é habitual, tenho estado atento às opiniões acerca deste livro. Não sei bem a razão, mas já desconfiava que Cinco Esquinas não se revelasse unânime na sua apreciação por parte dos leitores, principalmente aqueles que se exibem como sendo mais conservadores, para não chamar elitistas.
E, claro, como sucede muitas vezes, eu contrario a tendência. Não gosto de ser do contra, mas acontece com uma certa frequência não partilhar da mesma opinião da maioria.
Posto isto, achei Cinco Esquinas particularmente brilhante.
Llosa, ele próprio, não renegando à maioria das suas características, vem entre nós e escreve um livro para todos.
O que podemos esperar nestas páginas? Eu respondo: uma parte fundamental da história do Peru, contra a qual ele lutou, ou pelo menos tentou evitar; intrigas políticas e sociais; jogos duplos; a descrição de uma sociedade por vezes não muito distante da nossa; aventuras amorosas particularmente bem escritas; violência e traição; e, a minha parte favorita, muito pragmatismo no que respeita às atitudes de cada personagem. as quais não conseguimos distinguir quão sinceras realmente são. Este pragmatismo, esta falta de espontaneidade nas acções de cada homem e mulher que participam nesta trama, não é inocente. Com ele, Llosa é capaz de definir intimamente o interior do ser humano, seja individualmente, seja na sua interacção com os demais..
Toda narrativa revela-se verdadeiramente evolutiva. Começamos num impasse, ou vários, e partimos para acções bem definidas.
Mario Vargas Llosa é genial. Ele acaba por ser ímpar na sua capacidade de avaliar a sociedade e a política, tal como Saramago, por exemplo, o era. É por isso que este homem foi tão galardoado no mundo literário. E é com um imenso prazer que registo cada pequena parte da sua igualmente pequena loucura em cada página que leio da sua obra.
Um livro, portanto, a não perder. Para ler e devorar.