Esta excelente edição da Editorial Presença é composta por três contos extraordinários!
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O primeiro conto é de Dostoievski e é simplesmente surreal, uma vez que nos fala de um homem que foi engolido por um animal que dá nome ao conto, nada mais nada menos que um crocodilo! O acontecimento deu-se quando a vítima estava a visitar o animal (atracção turística) no Passage, decorria então o ano de 1965. Até aqui tudo normal, no entanto o sujeito em questão não sofreu nenhum ferimento ao contrário do que seria de esperar e até ajeitou-se confortavelmente dentro do crocodilo, começando a tirar partido da situação a seu favor.
Ivan Mavéitch vê logo um mar de vantagens na sua nova “casa”. Podia estudar o crocodilo no seu interior e assim dedicar-se às ciências naturais; Podia ainda trabalhar deitado; a sua esposa podia reunir em sua casa amigos e desconhecidos para falar da condição do marido; ele próprio seria uma atracção turística.
O dono da loja e sua esposa onde se encontra o crocodilo, duplicam o preço da entrada das visitas. O amigo, onde tenta buscar uma solução atribui a culpa desta situação à própria pessoa que foi engolida, pois esta deixou-se apanhar e agora encontra-se a “descansar” do trabalho.
Assim, através deste conto e dos seus personagens, onde tudo é hilariante, Dostoiévski consegue uma vez mais caracterizar a sociedade da altura.
Este conto é também uma demonstração de que Dostoiévski escreveu não só o estilo a que estamos acostumados: personagens complexos que se debatem com dúvidas existenciais (como Raskolnikov) em que a acção e arrependimento são uma constante. Personagens em que a mente humana é fortemente explorada.
Neste conto, de estilo diferente daquele que referi, Dostoiévski elabora uma crítica à sociedade, mas de forma leve e divertida, num estilo bastante diferente daquele que estamos acostumados.
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O segundo conto intitula-se Lázaro.
Em traços muitos gerais, a Bíblia diz-nos que Lázaro adoeceu e faleceu durante quatro dias. Após estes quatro dias de morte, Jesus Cristo ressuscitou-o. Sobre a sua segunda morte nada se sabe.
Neste conto em particular há a destacar a meu ver três aspectos: a morte que contrariada, persiste no olhar daquele que outrora fora sua vítima; o aspecto de Lázaro após a sua ressurreição e a curiosidade humana.
Lázaro, depois do seu regresso dos mortos, carrega no olhar a morte e todos que o olham ficam sem vida, ou seja, não morrem, mas é um viver desprovido de qualquer alegria ou interesse. No entanto, o ser humano é curioso por natureza e às vezes só acredita quando vê com os seus próprios olhos. Mesmo que haja o risco de perder o gosto pela vida, a curiosidade é bem mais forte. Desta feita, Lázaro é procurado pela simples curiosidade de verem o homem que Jesus Cristo ressuscitou e se este, realmente carrega a morte no olhar.
O aspecto de Lázaro é relatado sob o ponto de vista da ironia, pois este ressuscita com todas as marcas que a morte lhe deixou no corpo "és mesmo assustador meu pobre amigo, a morte não foi preguiçosa no dia em que tão imprudentemente caíste nas suas mãos"
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O terceiro conto “A Morte de Ivan Ilitch” é uma obra prima da literatura que nos fala também sobre a morte e como esta é encarada por quem se apercebe que está a chegar ao final dos seus dias. Podem ler o comentário a este conto aqui no blogue.
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Classificação (a esta edição da Editorial Presença) 6/7 Excelente

7 comentários:

    Eu nunca sonhei ler algo tão divertido escrito por Dostoievski. Aquele primeiro conto é fabuloso.
    O segundo surpreendeu-me pela imaginação e pelo simbolismo; como diria Mia Couto, Lázaro precisava de "remorrer"; até lá transportava a morte em vida.
    O terceiro conto também já o conhecia. É uma pequena maravilha de Tolstoi, em que ele mostra que também sabia escrever pérolas pequenas :)

     

    Oii
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    =)

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    Bj

     

    Ambas as opiniões, a tua e a do Manuel Cardoso, deixaram-me com a curiosidade ainda mais aguçada em relação ao conto de Dostoievski.
    Como já tenho o último conto desta obra, o mais certo é optar por não comprar, mas sim requisitá-lo numa biblioteca.
    Gosto muito desta capa!

     
    On 04 agosto, 2010 Paula disse...

    Manuel,
    Sem dúvida uma excelente edição da Presença :) não concordas?

    Alice,
    Obrigado pela simpatia e por achares que o blogue merece,

    Tons de Azul,
    Tenho a certeza que vais gostar :D

     
    On 18 agosto, 2010 Susana disse...

    Estou a ler este livro. Despertou-me o interesse no seguimento de uma viagem à Rússia, onde visitei a casa de Tolstói em Moscovo.

    Sabiam que Tolstói fazia sapatos? E que no fim da vida via mal e por isso cortou os pés da cadeira da sua secretária para ficar mais próximo das palavras?

    Vou iniciar agora a leitura do seu conto.

     
    On 18 agosto, 2010 Paula disse...

    Olá Susana,
    Eu sabia que Tolstoi tinha cortado os pés da tal mesa, não sabia é que ele também fazia sapatos. Como disse aqui a MJFalcão, "o homem afinal era humano" Acho que vais gostar do conto!
    Abraço

     
    On 12 setembro, 2010 Luis Narval disse...

    Muito bom saber que "Andreiév", (como seu nome é grafado nestas latitudes)ainda é publicado por aí. Aqui no Brasil, lamentavelmente, ele só é encontrado, quando muito, nos sebos. Considero-o um dos grandes, ao lado de Tolstói, Dostoievski e Tchekhov. Seu romance "Os Sete Enforcados", é qualquer coisa de absoluto.

     

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